segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A Nona Sinfonia vista por Berlioz (Parte 1)

Sendo a nossa sinfonia preferida a Nona Sinfonia de Beethoven resolvi, como prémio de participação a todos os que por aqui passaram e votaram, fazer-vos uma pequena surpresa: Oferecer-vos uma tradução do texto com o qual Berlioz analisou a Nona Sinfonia de Beethoven. Aqui fica portanto a minha tradução do texto de Berlioz a partir do original em Francês.

O texto é por vezes um pouco técnico outras vezes revela de forma deliciosa o carácter de novidade que a obra de Beethoven "ainda" possuía no tempo de Berlioz e por isso em alguns pontos poderão encontrar um outro comentário meu (devidamente assinalados claro está). Berlioz que ele mesmo é um compositor merecedor da nossa admiração venera como veremos o grande mestre.

Finalmente tenho de vos confessar que para a atenção dos nossos dias o texto é um pouco longo e por isso resolvi dividi-lo em três partes que serão intercaladas com outros posts ... Na primeira parte teremos a Introdução, na segunda a análise a todos os movimentos excepto o quarto e por eliminação de hipóteses na terceira parte teremos o detalhe do quarto andamento.

Inicio do texto de Berlioz

Analisar tal trabalho é uma tarefa dificil que hesitei concretizar durante muito tempo. A única desculpa para uma tal aventura pode apenas repousar nos nossos esforços permanentes para ver a composição através dos olhos do compositor, penetrar o significado intimo, experimentar o seu impacto e estudar as impressões que suscitou naqueles que dispõem de uma sensibilidade excepcional assim como o público em geral.


Entre as várias análise expressas existentes deverá ser muito dificil encontrar duas concordantes. Alguns críticos consideram-na uma insanidade monstruosa; outros vêm na obra os brilhos que se apagam de um génio a morrer; outros mais cautelosamente argumentam que lhes parece por agora completamente incompreensível, mas não desesperam esperando vir a entendê-la mais tarde; a maioria no entanto daqueles que possuem sensibilidade artística considera-a uma concepção extraordinária apesar de algumas partes se manterem inexplicáveis e sem objectivo aparente.

Um pequeno número de músicos que por temperamento estão inclinados para examinar tudo o que possa expandir o reino da sua arte e que pensaram profundamente sobre a estrutura da Sinfonia Coral após terem estudado as partituras e ouvido-a atentamente várias vezes, afirmam que este trabalho lhes parece a mais perfeita expressão do génio de Beethoven: Acreditamos que já referimos que esta é a opinião que partilhamos.
 
Sem perguntar que ideias pessoais o compositor pode ter querido exprimir neste vasto poema musical - um tema completamente aberto a variadas conjecturas individuais - vamos procurar perceber se a originalidade da forma é justificada neste caso por uma intenção que é independente de qualquer pensamento filosófico ou religioso, pensamento esse que poderia parecer igualmente razoável e belo a qualquer um, seja ele um fervoroso cristão, um panteísta ou ateu, pensamento esse assim puramente musical e poético.

Beethoven já tinha escrito oito sinfonias antes de conceber esta. Para progredir em relação ao ponto que já tinha atingido apenas com recursos a instrumentos que outros meios teria disponíveis ? A resposta é a adição da voz humana. Mas para respeitar a regra do crescendo e para valorizar o poder do recurso adicional que desejava proporcionar à orquestra tinha na mesma de dar aos instrumentos o direito de serem os protagonistas na primeira do enquadramento musical que nos pretendia proporcionar. 

Uma vez estabelecido este pressuposto é fácil perceber o que levou à procura de um meio musical misto para servir de ligação às duas grandes articulações da sinfonia. O recitativo instrumental foi a ponte que ele teve audácia de utilizar entre o Coro e a Orquestra através da qual os instrumentos atravessaram e se juntaram às vozes.

Uma vez a transição estabelecido o compositor deverá ter desejado anunciar e motivar a fusão que se estaria a preparar. É nesse momento que falando através do solista do coro exclama, ao som do recitativo instrumental que tinha acabado de introduzir: Amigos! Não mais sons como estes, vamos cantar sons mais alegres, cheios de alegria ! Isto é por assim dizer o tratado de aliança entre o Coro e a Orquestra; o mesmo tema do recitativo utilizado tanto pela orquestra como pelo coro parece constituir a formula do juramento. Após isto restava ao compositor escolher o tema para a sua composição coral: Para isto Beethoven resolveu seleccionar Schiller e a sua "Ode à Alegria". Coloriu-a com incontáveis nuances que a poesia só por si nunca conseguiria transmitir e progride até ao fim adquirindo sempre mais e mais esplendor, grandeza e brilho.



Este é o racional que pode ser sugerido de forma mais ou menos plausível para o esquema geral deste imenso trabalho; vamos então agora estudar as suas partes individuais em detalhe.

Fim da primeira parte do Texto de Berlioz.

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