domingo, 11 de março de 2012

Mahler - A Nona Sinfonia

Continuando a completar a minha lista das 100 obras hoje iremos falar da Nona Sinfonia de Mahler. A propósito desta lista já expliquei que o critério da mesma é pessoal, destina-se essencialmente a quem pense não gostar de música clássica e queira conhecer algumas obras. Procurei na lista incluir todas as épocas, todos os géneros, todos os instrumentos. alguns leitores acusaram-na de ser um conjunto de "lugares comuns", talvez. Aliás esse é mesmo o objectivo: tornar estas composições lugares comuns para muito mais pessoas.

Quanto à nona de Mahler bem lá está a famosa maldição das nonas sinfonias. Maldição para os compositores eventualmente porque para os ouvintes é o extase que nos espera. Se nunca ouviu esta obra agora com o frio e  eventualmente um cobertor e se possível uma lareira (umas velas também dão) instale-se confortavelmente desligue a luz e deixe-se embalar.

Esta obra de Mahler é polémica quanto ao seu "significado" já que existem musicólogos que vêm na obra uma despedida, vêm um Mahler perturbado pela morte da sua filha e obcecado pela sua condição física embora resignado ou conformado enquanto outros vêm na obra um intenso prazer pela vida e o amor da terra. Outros ainda como Bernstein pensam que a Sinfonia e os seus quatro andamentos são na verdade quatro formas diferentes de despedida ... A verdade é que esta é a ultima Sinfonia completa que Mahler escreveu e de que não chegou a ouvir a estreia embora entretanto tenha iniciado a composição da Décima Sinfonia que ficaria incompleta. Na verdade Mahler faleceu a 8 de Maio de 1911 tendo a nona sinfonia sido estreada a 26 de Junho de 1912 pela Filarmónica de Viena dirigida por Bruno Walter. Para ilustrar os vários andamentos utilizamos um filme de Bernstein com os ensaios com a Filarmónica de Viena (Bernstein fala da Nona de Mahler ) e a interpretação de Haitink com a Orquestra ConcertGebow naquela que também foi a despedida do maestro dessa Orquestra depois de 23 anos como director musical, apropriado portanto para uma longa metáfora da despedida.

O primeiro andamento (Andante Comodo) poderá representar a juventude do compositor. Acredita-se que poderá ser assim pela citação recorrente de um tema da Sonata nº 26  de Beethoven "Les Adieux"  (op. 81) que o compositor tocou na sua estreia enquanto instrumentista ainda em Viena (na saída do Liceu). Segundo Bernstein no entanto este andamento é a despedida de Mahler do amor e da ternura terrena. Bernstein estava convencido que o ritmo utilizado no inicio é uma forma de representação do próprio bater de coração de Mahler. Devido à duração deste primeiro andamento o resto pode ser ouvido aqui (2/3) e aqui (3/3).

O segundo andamento (No tempo de um Landler) começa por ser uma dança popular, um landler para ser preciso como aliás indica a menção do tempo. Despede-se neste andamento Mahler segundo Bernstein dos prazeres simples da vida do campo, da natureza. A utilização do landler (o antecessor da valsa) que se vai aos poucos distorcendo ao ponto de ser tornar quase grotesco poderá também representar os prazeres básicos não intelectualizados não "tratados" tudo repleto de amargura que lhe confere a dimensão da despedida (pode ouvir o restante do segundo andamento aqui )

Se o segundo andamento é o da não sofisticação então o Terceiro (Rondo - Burlesque - Allegro Assai) é a despedida aos prazeres mais sofisticados os prazeres urbanos se quisermos, isto sempre segundo Leonard Bernstein. Descreve uma sociedade decadente, quase louca ou histérica divertindo-se sem qualquer propósito. Deve soar a loucura diz Bernstein este andamento profundamente irónico e caricatural. Apesar das tentativas de Mahler de introduzir alguma ordem o andamento acaba num verdadeiro tumulto como se não houvesse solução possível para essa sociedade "urbana" e sofisticada. Podem ouvir o resto deste andamento aqui.

O quarto andamento (Andante - Muito Lento) por seu lado começa com uma melodia lindíssima que Bernstein diz que é propositadamente um cliché uma reminiscência de música religiosa. Trata-se agora da morte ela mesma, o fim da vida, um Requiem se quisermos. Mas ao fim de alguns minutos a característica do movimento modifica-se tornando-se quase transcendental eterea como uma metáfora da desagregação do corpo. Porém o movimento não acaba sem que exista uma ultima explosão de matéria, um ultimo e amargo sorvo de vida que se extingue aos poucos (numa série de tentativas cada uma menos forte que a anterior) e numa coda e num dos fins mais calmos de toda a história da música.  O quarto andamento também teve de ser partido em três partes por quem postou a interpretação que nos tem servido de guia, podem ouvir as partes remanescentes aqui (2/3) e aqui (3/3).

Se quiserem ouvir tudo seguido têm no You Tube uma boa interpretação de um outro grande especialista de Mahler George Norrington com a Sinfónica de Stuttgard (discutível na escolha dos tempos mas isso em Mahler é questão para acalorados debates em que não entraremos)

A escolha da uma interpretação de referência não é nada fácil (é que com base nesta gravação há pelo menos uns dois ou três Grammys e vários outros prémios com maestros como Karajan, Boulez ou Solti). Poderíamos sem dúvida escolher Bernstein (Bernstein entendia Mahler como poucos - ouçam por exemplo um dos mais notáveis programas da série Young People´s Concerts Bernstein explica quem é Mahler) mas para variar decidimos escolher uma interpretação de Claudio Abbado com a Filarmónica de Berlim que não fica nada atrás dos já mencionados. Mahler é como diz Bernstein música que não pode ser ouvida sem nos emocionarmos por isso trata-se de escolher quem nos consiga. O ambiente certo ajuda daí a minha sugestão inicial e agora depois de toda esta conversa estais prontos.




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