A Mafalda, minha namorada e mulher faleceu na passada quinta-feira. No passado era costume publicarem-se estas noticias nos jornais. Nunca percebi muito bem porquê até ontem a razão dessa necessidade. Pensava eu que a expressão da dor era algo que se deveria a familiares e amigos. Pensava mal e por isso opto por esta forma moderna de vos dizer o que aprendi ao longo de trinta anos de namoro e de vida em comum.
É curto o que tenho para vos dizer sobre a Mafalda. Com a Mafalda aprendi o que é o amor e a preocupação pelo próximo. A Mafalda era exigente na utilização da palavra amigo porque entendia que isso implicava um compromisso profundo e inquebrável de solidariedade e de ajuda. Era tão exigente com ela como connosco sempre exprimindo com absoluta sinceridade o que pensava. E tantas e tantas vezes achei demasiado dura a sua percepção, tantas outras não estive à sua altura ...
A Mafalda cedo percebeu que o amor que tinha para dar não se podia limitar ao seu marido e filho e por isso partilhou-o durante mais de 10 anos no IPO na Associação Acreditar e durante 3 anos na unidade de cuidados paliativos do Hospital da Luz. A Mafalda não teria gostado muito deste paragrafo. Acreditava que esta acção de solidariedade se deve viver sem protagonismo ou publicidade. Eu até concordo mas espero que esta mensagem nos sirva de exemplo e possamos nós seguir o mesmo caminho. Não é segredo para os nossos amigos o quanto a Mafalda pensava que esta nossa sociedade precisava de repensar os seus valores. Desafio-vos a todos a aproveitarem esta ocasião para reflectirem sobre o que é verdadeiramente importante.
Faria 3 anos em Novembro que publiquei a Lista da Mafalda o ultimo aniversário que passou sem consciência da doença que provavelmente já a afligia. Dessa lista que ela me pediu para publicar a ultima das canções de António Carlos Jobim dizia : ""A tua vida é uma linda canção de amor ... Se todos fossem iguais a você que maravilha seria viver ... ". E seria certamente.
E é curto o que tenho para vos dizer não porque não houvesse muito mais para contar mas antes porque não desejo que tudo o resto apague ou atenue o que acabei de vos dizer.
Eu sei que a Mafalda está neste momento numa existência melhor. Ambos acreditávamos que existe em cada ser humano algo que transcende a nossa existência física. Para aqueles que como nós acreditam encontrai nessa certeza a vontade de vos transcenderes e de viver com alegria a nossa existência terrena. Deus sabe que é isso que eu farei. Sei que alguns de vós não partilharão essa fé. Para a Mafalda isso não era importante. O que era relevante era mesmo a preocupação e o amor que tinham (têm) pelos outros. Isso definia-vos como seus amigos. Para vós encontrai conforto na memória das suas brincadeiras e ralhetes (quem foi seu amigo haverá de ter passado por ambas as situações). Era assim que ela desejava ser lembrada.
Num email que me escreveu muitos anos antes de falecer pediu-me para que fosse rezada uma missa de sétimo dia. Convido-vos a estarem presentes na Igreja do Campo Grande na próxima Quinta-Feira dia 4 de Agosto às 19h. Se não puderem estar rezem na mesma, estou certo que ela gostará da mesma forma. Se não quiserem rezar tomem uns minutos para pensar nela. Estou seguro que a Mafalda apreciará da mesma forma.
A todos os nossos amigos que nos têm acompanhado nestas horas difíceis um grande abraço. São normalmente tristes os Requiem. Pela saudade que nos deixa a pessoa que partiu. Na tua lista Mafalda escolheste Zeca Afonso e por todas as razões incluindo a circunstância, a coincidência da vossa doença, é com a sua Canção de Embalar que termino.