Há algum tempo que não vos fazia uma recomendação de uma actividade deste género. Do dia 18 a 23 de Março irá decorrer em Lisboa um Workshop para jovens músicos em que estes terão oportunidade de participar em Master Classes, em ensaios de Naipe e de Orquestra. Destinado a jovens músicos dos 8 aos 21 anos estes serão divididos em três orquestras, Big Band, Orquestra de Iniciação e Orquestra de Cordas Avançada.
Subordinado a um tema interessantíssimo "O Legado de Piazzola" este Workshop contará com a participação do saxofonista Henk Van Twillert e do acordeonista Pedro Santos. O meu filho participou em vários workshops desenhados por esta equipa e por isso posso recomendar-vos com inteira confiança.
O reportório que irá ser interpretado não é fácil e por essa razão recomenda-se a inscrição e preparação o mais antecipada possível. Para todas as informações adicionais é simples, visitem o site: Festival Música Junior
Ontem à noite fui ouvir o concerto da Sinfónica Juvenil na Aula Magna, um concerto comemorativo do 100º Aniversário da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Em primeiro lugar aqui ficam os parabéns à Faculdade e aos seus juristas.
Queria começar por vos contar um pouco do que foi dito antes do concerto pelo musicólogo e advogado porque foi uma introdução muito interessante pelo Prof. Doutor Mário Vieira de Carvalho. Foi interessante porque abordou a eterna questão da musica enquanto forma de arte puramente abstracta e aquela a que se pretende dar um significado especifico quer através de junção com outras formas de arte como por exemplo a literatura (ópera por exemplo ou o canto lírico quer pela procura de uma linguagem especificamente descritiva (o poema sinfónico). Esta eterna questão cristalizada no que foi apelidado a "Guerra dos Românticos" com Clara Schumann, Brahms e o musicólogo Hanslick de um lado da barricada a favor da música "pura" e abstracta e do outro Wagner, Liszt (com os seus poemas sinfónicos).
Na altura esta guerra era também uma guerra do novo contra a tradição curiosamente uma disputa que foi essencialmente germânica e ainda mais curioso partindo da admiração de um mesmo homem: Beethoven. A diferença sendo que Brahms e Hanslick viam-no como um pico inultrapassável enquanto Wagner e Liszt marcavam-no como o começo de uma nova música.
Creio que hoje permanece dessa interessante querela a questão de saber se efectivamente a música na sua essência pode ou deve ser precisamente ilustrativa ou se antes como o Prof.Mário Vieira de Carvalho afirmou devem existir tantos concertos de Brahms no seu significado como os seus interpretes - quer sejam esses interpretes os pianistas ou os "simples" ouvintes.
Não creio que exista uma resposta única para essa questão embora tenha a certeza que a música é na sua essência abstracta e que logo o seu significado depende em muito do receptor e do interprete. Podemos é claro induzir uma interpretação através da colocação de um cenário emocional - não vejo nada de errado nisso - ou através de elementos musicais que procurem imitar sons que nos remetam para um determinado estado de espírito (embora aqui me pareça que essa associação já será mais cultural que concreta) e também não vejo nada de errado nisso mas no fundo para mim a beleza é que no fim cada ouvinte terá ainda assim uma grande latitude de liberdade e essa liberdade de imaginação para mim é a música.
Já agora e antes de passarmos ao programa o mais curioso de tudo é que do programa constava também uma obra de Mendelssohn "A Gruta de Fingal" que pertence ao grupo daquelas obras que estão entre a música abstracta e a programática. E o mais curioso de tudo é que Mendelssohn foi o fundador do Conservatório onde se sediava a base de Brahms e de Clara Schumann. Ironias do destino.
Mas chega de conversa e vamos então à música. O programa de ontem começou com a abertura "Le Nozze di Figaro" - que contrariamente ao que o programa diz não é o K. 620 (essa é a Flauta Mágica) mas sim K. 492. Escolhi para vos mostrar uma interpretação de James Levine no Metropolitan de Nova Iorque.
Seguiu-se uma obra e um compositor que desconhecia por completo mas que foi uma agradável surpresa. Bertha Tressler violinista compositora e aluna de Max Reger foi tudo que conseguir descobrir até agora. Versões do que ouvimos ontem no You Tube não existem. Ou seja meus amigos relativamente a esta obra estou como no tempo em que não existia a possibilidade de gravar. E sabem uma coisa? Aquele momento ontem tornou-se de repente único. Acreditem que nos parece diferente, especial.
Seguiu-se precisamente a abertura "A Gruta de Fingal" Op. 26 (mas erro do programa sem os andamentos que na verdade pertencem ao Concerto de Piano de Brahms - repetidos portanto). Aliás o nome desta obra tanto pode ser o indicado como "As Hébridas" dado que ambas as designações foram utilizadas por Mendelssohn. Esta abertura note-se não é uma abertura no sentido operático do termo. É uma obra que vale por si só não pretende ser a introdução a nenhuma outra de maior dimensão. Composta na juventude de Mendelssohn tem a particularidade interessante pelo que expus no inicio deste post de estar a meio caminho entre a música programática e a música abstracta. Foi inspirado de uma experiência concreta do compositor (a visita à referida gruta que existe nas Hébridas) que transparece no titulo e na correspondência trocada com a sua irmã. Se ouvirmos a obra sem o saber conseguiríamos percepcionar isso? Provavelmente não. Culturalmente o tipo de melodia certamente nos remete para a aventura mas mesmo isso ... Não deixa de ser no entanto uma obra fantástica que vos deixo propositadamente com um video que começa com uma imagem da natureza selvagem dessas ilhas no extremo norte da Escócia. E agora não vão acreditar na coincidência Quando o concerto acabou cheguei ao carro liguei o rádio e adivinhem o que estava a ser transmitido na Antena 1? ...
Por fim o concerto de Brahms que como o post e a conversa já vai longa vos deixo sem mais palavras, tal como disse o Prof. Doutor Mário Vieira de Carvalho para não vos condicionar. Ontem à noite o concerto foi interpretado pela pianista Teresa da Palma Pereira. Para vos ilustrar esta obra escolhi uma interpretação que poderia qualificar histórica de 1953 com Wilhelm Backhaus (1884-1969) ao piano no Großer Musikvereinssaal em Viena com a Filarmónica de Viena dirigida por Karl Böhm. Histórica porquê ? Bom entre outras razões além da excelência musical dos interpretes não se esqueçam que a guerra tinha terminado há apenas oito anos ...