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Tchaikovsky concebeu a quarta sinfonia entre Março e Dezembro de 1877. Foi interpretada pela primeira vez em Moscovo em 22 de Fevereiro de 1878 dirigida por Nikolai Rubinstein.
A sinfonia é dedicada à patrona de Tchaikovsky, Nadehzda von Meck, tendo o compositor escrito na primeira página "à minha melhor amiga". Do ponto de vista pessoal convém notar que esta obra coincide com o casamento falhado com Antonina Miliukova que foi muito delicado do ponto de vista emocional mas que curiosamente acabou por, apesar de existirem cartas de Tchaikovsky que indicam o contrário, aumentar de forma significativa a sua criatividade. Na verdade para além desta quarta sinfonia durante este período Tchaikovsky estava também a trabalhar no seu concerto para violino e também a sua ópera Eugene Oniegin. Muitas obras primas em simultâneo na verdade !
A reacção do público a esta sinfonia como foi quase tradição nas obras de Tchaikovsky não foi de imediata euforia mas pode considerar-se que foi uma obra relativamente bem recebida.
Curiosamente em relação a esta obra Tchaikovsky esclareceu de forma relativamente completa a sua intenção graças precisamente à explicação que forneceu à sua patrona sobre as suas intenções e também mais tarde pela polémica que teve com Serguei Taneev. Estas cartas são maravilhosas e a sua relevância vai muito para além da obra em causa dado que nos permitem sem dúvida ter uma percepção do que significava para Tchaikovsky o conceito de música programática e pode mesmo ser visto como uma excelente introdução teórica a esse conceito. Fiquemos então com algumas palavras de Tchaikovsky sobre esta obra dirigidas a sua patrona:
"Perguntou-me se há um "programa" para esta sinfonia. Normalmente a minha resposta para esta pergunta num trabalho sinfónico seria: "Absolutamente nenhum". E na verdade essa é a minha resposta para a sua questão. Como podemos por palavras em sentimentos tão intangíveis como as nossas próprias experiências quando escrevemos uma obra instrumental sem um tema especifico ? Este é um processo puramente lírico e essencialmente uma forma de libertar a alma em música semelhante à forma como um poeta se exprime em versos ... Na nossa sinfonia (à margem deste texto notem como Tchaikovsky atribui à sua patrona um papel igual na concepção da sinfonia, algo que era típico das relações entre patrono e artistas fundadas na igualdade, no quase companheirismo) existe um programa, isto é, é possível exprimir em palavras o que estou a tentar dizer, e para si, apenas para si (oops, estamos aqui a quebrar um segredo mas também me verdade era um segredo um tanto mal guardado) consigo e estou disposto a tentar explicar o significado do todo e de cada um dos movimentos em separado. Claro que apenas é possível fazer isto de forma bastante abstracta."
A introdução que é a semente de toda a sinfonia, indiscutivelmente a ideia principal. É o destino: É aquela força fatal que impede o impulso para a felicidade, que com inveja impede que a paz e a felicidade sejam completa e sem nuvens que está sobre as nossas cabeças como uma espada de Damocles constantemente envenenando a alma. Uma força invencível, uma força que nunca pode ser derrotada, apenas suportada, miseravelmente suportada.
Esta obra foi sempre uma das preferidas do compositor que a considerava uma das sua sobras primas. É correntemente uma das suas obras mais vezes interpretada embora não tanto como a Sexta Sinfonia ou o seu primeiro Concerto para Piano ...
Para vos ilustrar esta sinfonia escolhemos uma interpretação da Sinfónica de Chicago na abertura da época de 1997 dirigida por Barenboim.
O primeiro andamento (Andante sostenuto—Moderato con anima) em Fá menor é mais longo da sinfonia e começa com o chamamento do destino, um pouco à imagem da Quinta de Beethoven. Retomando o que Tchaikovsky dizia à sua patrona:
"E então é a vida nas suas alternâncias continuas de dura realidade com os breves sonhos e visões de felicidade ... Não existe céu ... Navegar sem rumo no mar até que este nos submerge nas suas profundezas. Este é de forma geral o "programa" deste primeiro andamento". Oiçam-no aqui e aqui.
Para nos descrever o segundo andamento (Andantino in modo di canzona) em Si bemol menor (assim como os restantes) vamos continuar com Tchiakovsky na sua abençoada carta ...
"O segundo movimento expressa outra fase de tristeza. É a melancolia que de fim de tarde quando cansados das provações do dia nos sentamos com um livro mas que cai da nossa mão, cansada. Vêm então as memórias. É ao mesmo tempo triste tanto porque tanto é passado e não volta como é agradável recordar a juventude mas não desejando voltar a vivê-la de novo. A vida cansa. É agradável descansar e olhar em volta. Há muitas memórias. Momentos felizes quando o sangue jovem ardia e a vida nos satisfazia; há também memórias dolorosas, perdas irreversíveis. E tudo isto é agora distante. É ao mesmo tempo triste mas de certa forma doce estar submergido no passado."
Oiçam este segundo andamento aqui.
Diz Tchaikovski do Terceiro andamento (Scherzo. Pizzicato ostinato. Allegro) em Fá maior o seguinte:
"O terceiro andamento não exprime nenhum sentimento especifico. É feito de arabescos caprichosos, de imagens fugazes que dissolvem depressa na imaginação depois de bebermos um pouco de vinho e sentirmos as primeiras fases da intoxicação. O espírito não é alegre nem triste. Pensando em nada dando livre curso à imaginação que de repente começa a pintar figuras estranhas. Entre essas memórias surge a imagem de camponeses bêbados e uma canção de rua ... então ao longe passa uma coluna militar. São imagens dispares que nos passam pela cabeça enquanto dormitamos. Não têm qualquer relação com a realidade; são estranhas, selvagens e disjuntas."
Oiçam o terceiro andamento aqui.
O quarto andamento (Finale. Allegro con fuoco) em Fá maior. Este andamento utiliza a canção popular russa "No campo erguia-se uma árvore". Voltando a Tchaikovsky:
"Se dentro de si não encontrar motivos de alegria então olhe para outros. Junte-se às pessoas. Veja como elas conseguem divertir-se, deixando-se ir em pensamentos verdadeiramente felizes. Lembre-se da alegria natural das pessoas comuns. Aos poucos embora com dificuldade conseguirá esquecer-se de si própria e deixar-se ir pelo espectáculo de alegria dos outros. Então volta a face incontornável do destino que lhe relembra a sua existência. Os demais não se preocupam consigo e não notam que está sozinha e triste. Oh, como se divertem.Como estão felizes e os seus sentimentos são simples.Não poderá fazer outra coisa senão criticar-se a si própria. A alegria é simples mas poderosa. Alegre-se na alegria dos outros. Viver ainda é possível."
Oiçam o quarto andamento aqui.