domingo, 2 de novembro de 2008

Brahms ( 1833 - 1897) - Uma Biografia (Primeira Parte)

Terminamos hoje a série de post sobre Brahms com uma biografia e uma recordação das suas obras principais. Como esta biografia é bastante extensa para tornar mais fácil a sua leitura vamos dividi-la em quatro partes. O que escrevemos nesta biografia é baseado nos trabalhos de John Lawrence Erb e H.C. Colles. Esta primeira parte descreve os primeiros anos de vida até ao encontro com os Schumann e o artigo que iria tornar Brahms famoso.

Brahms nasceu em Hamburgo a 7 de Maio de 1833. O pai Johann Brahms era um bom músico, tendo sido director musical na Orquestra Municipal (Stadt Theater). Segundo a biografia de o pai no inicio opôs-se a que Brahms seguisse a carreira de músico embora seja aparente que essa opinião se tenha modificado pouco a pouco. Nesses primeiros tempos, a mãe, dezassete anos mais velha que o pai foi o apoio que Brahms precisava.

Apesar do pai ser considerado como um dos melhores músicos de Hamburgo (estava entre os 40 melhores contrabaixo da Alemanha) a vida da família era dificil, vivendo em bairros pobres da cidade.

Brahms desde muito cedo demonstrou uma paixão pelo piano. Este facto é visível nas várias anedotas do quotidiano - diz-se por exemplo que tocava piano a quatro mãos com a sua mãe "apenas para se divertir" - mas também pelo facto do seu primeiro professor Otto Cossel logo aos dez anos ter-lhe recomendado um professor mais avançado Eduard Marxsen com quem iria estudar piano e composição durante largos anos.

Já nessa altura Brahms tinha também marcado o seu gosto pela composição. Na verdade mesmo ante de saber música Brahms inventou um sistema de notação próprio para fixar as melodias que inventava no piano ...

Em 1848, portanto com 15 anos apresenta-se pela primeira vez em público, aparentemente com a oposição inicial do seu professor. O programa incluía entre outras composições a sua Op. 1, uma sonata para piano baseada numa melodia popular, hábito que aliás Brahms manteria. Daria nessa altura mais dois concertos mas depois durante cinco anos não mais se apresentou em público utilizando o seu tempo para aperfeiçoar a sua técnica e arte de composição. Esta terá sido uma decisão imposta pelo seu professor Eduard Marxsen pelo que é justo dar a este homem uma parte do crédito de nos ter proporcionado tantos momentos de prazer com a música de Brahms.

Em 1953 Brahms inicia a sua primeira tournée acompanhando o violinista húngaro Edouard Remenyi. Até aí Brahms tinha passado alguns momentos difíceis tendo sido completamente ignorado enquanto compositor e conhecido um sucesso moderado enquanto pianista. Mas esta tour iria mudar tudo completamente.

A causa foi o famoso concerto em Gottingen onde deviam tocar a sonata para piano e violino Kreutzer de Beethoven. Acontece que o piano estava mal afinado (um meio tom acima) e que já não havia tempo para o afinar. Afinar o violino para o tom do piano arruinaria o efeito. Então Brahms propõe-se tocar a sonata meio tom acima transcrevendo de memória e em tempo real.

Quem dos nossos leitores for pianista saberá a dificuldade do que acabamos de descrever. Na prática, não é exactamente apenas isto mas permitam-me esta liberdade poética para conseguir explicar a natureza do virtuosismo, significa tocar a peça mentalmente lembrando-se da tecla a pressionar e mudando para a tecla imediatamente seguinte. As teclas pretas "contam" e por isso em vez de tocar numa branca Brahms teria que tocar na preta mais aguda imediatamente consecutiva - percebem? Isto tudo sem perder o sentido da musicalidade ...

Mas dizíamos este concerto iria mudar o destino de Brahms porque para sua fortuna o grande violinista Joseph Joachim estava entre a audiência e assim que o concerto acabou falou com os artistas, felicitando-os pelo concerto e propondo cartas de recomendação para a corte em Hannover e para Liszt. Em Hannover tudo parecia correr pelo melhor mas depois de um primeiro concerto que foi um sucesso a policia proibiu o segundo e expulsou os dois músicos para Weimar. Este facto segundo se veioa apurar mais tarde estava relacionado com Edouard Remenyi que sendo um nacionalista húngaro teria participado em actividades subversivas ...

Não restava outra hipótese que ir para Weimar onde de novo as coisas pareciam bem encaminhadas. No primeiro concerto Liszt estava entre a audiência e fica impressionado com o jovem pianista , tanto que o convida a visitar a sua residência no dia seguinte instigado por Remenyi.

Ao chegar à casa do mestre Brahms está de tal forma nervoso que se recusa a tocar mesmo depois Remenyi e o próprio Liszt insistirem. Liszt então pega no Shcerzo da Op. 4 de Brahms e interpreta-o de forma excepcional. Infelizmente um pouco depois a pedido dos presentes aceita tocar uma sonata que tinha acabado de compor recentemente e Brahms, fatigado de tanta viagem teria adormecido.

Embora Liszt nunca tenha cobrado essa falta de delicadeza a Brahms o facto é que os dois nunca cultivaram a partir daí grande ligação. Mais ainda é possível que tenha sido deste incidente que tenha resultado a grande animosidade dos Wagnerianos em relação a Brahms, embora nesse particular, sem nunca contarem com o apoio implicito ou explicito de Liszt.

No dia seguinte Brahms deixa Wiemar de novo para Gottingen onde espera obter a carta de recomendação que Joseph Joachim lhe havia prometido para Schumann. Terá de esperar até ao fim do verão aproveitando para assistir às aulas de Joachim. Em Setembro dirige-se então a pé de Gottingen a Dusseldorf a casa dos Schumann onde é recebido com o calor humano próprio da família Schumann.

Do ponto de vista artístico a primeira reacção de todos os que frequentavam a casa dos Schumann é em primeiro lugar de cepticismo. Porém assim que ouvem pela primeira vez Brahms interpretar uma peça de Schumann o sucesso é completo. O entusiasmo de Schumann materializa-se então num artigo que viria a ficar famoso não só pela polémica gerada mas porque iria lançar Brahms de forma definitiva ainda que atraindo ao mesmo tempo alguma má fé de alguns críticos. Nesse artigo Schumann dizia o seguinte (tradução minha a partir da versão em Inglês).

"Neue Bahnen" - Novos Caminhos

[...]
" e ele chegou, este jovem escolhido, ele sobre o qual as Graças e os Heróis parecem ter mantido a atenção. O seu nome é Johannes Brahms e vem de Hamburgo onde tem trabalhado em tranquilidade obscuridade com o seu excelente e dedicado professor nas partes mais delicadas da sua profissão. [...] Depois somos arrastados para um círculo encantado. Veio depois um momento de inspiração em que o piano se transformou numa orquestra cheia de vozes diferentes. Havia sonatas, ou antes sinfonias escondidas, canções cuja poesia se revela mesmo sem palavras enquanto em todas parece percorrer uma profunda melodia; melodias meio-demoníacas e formas mutantes; sonatas para violino e piano; quartetos de cordas e cada um destas criações tão diferente das restantes que pareciam provir de fontes diferentes. E depois como numa gigantesca cascata todas estas fontes unem-se e no vapor da queda formam-se arco-iris de paz onde rouxinois cantam as suas canções. [...]

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