segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Deolinda - Que parvo que sou

Nas nossas conversas musicais (nem sempre são sobre música clássica dado que ambos gostamos de outras coisas) o meu filho chamou-me a atenção para esta nova canção original cantada nos recentes espectáculos nos Coliseus de Lisboa e do Porto.

Esta gravação da canção Que Parva que eu Sou foi efectuada no Coliseu do Porto conforme diz a Blitz no seu artigo de que transcrevo a letra da canção:

Sou da geração sem remuneração
E não me incomoda esta condição
Que parva que eu sou
Porque isto está mal e vai continuar
Já é uma sorte eu poder estagiar
Que parva que eu sou
E fico a pensar
Que mundo tão parvo
Onde para ser escravo é preciso estudar

Sou da geração "casinha dos pais"
Se já tenho tudo, pra quê querer mais?
Que parva que eu sou
Filhos, maridos, estou sempre a adiar
E ainda me falta o carro pagar
Que parva que eu sou
E fico a pensar
Que mundo tão parvo
Onde para ser escravo é preciso estudar

Sou da geração "vou queixar-me pra quê?"
Há alguém bem pior do que eu na TV
Que parva que eu sou
Sou da geração "eu já não posso mais!"
Que esta situação dura há tempo demais
E parva não sou
E fico a pensar,
Que mundo tão parvo
Onde para ser escravo é preciso estudar

Ora bem, antes de mais deixem-me dizer-vos que acho que este grupo é um daqueles que tem verdadeiramente inovado na música popular portuguesa tanto do ponto de vista musical como no ponto de vista da lírica, normalmente inteligente e de grande qualidade tal como a componente instrumental sempre excelente. Esta canção em particular considero-a mais uma vez extraordinariamente lúcida. Acredito mesmo que a geração de que falam veja a vida desta forma. Porém deixa-me uma enorme vontade de responder e para que não destoe aqui vai uma resposta à desgarrada que podem cantar sobre o mesmo fundo musical. Perdoem desde já os mais novos a utilização da palavra "parvos" foi apenas para manter o mesmo adjectivo, não creio que se trate de "parvoíce" ...

Sois da geração sem remuneração
mas com educação
que parvos que sois
Porque isto está mal e deixais continuar,
não é o azar
que vos impede de mudar,
E deveriam pensar
Que o mundo não pode esperar,
Porque não basta estudar é preciso lutar.

Se não vos agrada a casinha dos pais
Se achais que já tendes tudo, porque não dais aos demais?
Que parvos que sois,
Família e filhos adiais
por causa de bens materiais?
O amor deveria chegar!

E deverias pensar
Que o mundo não pode esperar,
Porque não basta estudar é preciso lutar.

Em vez de aos piores comparar 
Em vez de ver parvoíces (essas sim) na TV
Se já não podeis mais
Que esperais ?
A situação dura mesmo à tempo demais!
Parvos não sois,
Mas tendes de mudar
porque na verdade não basta estudar,
é preciso lutar !

Ah e antes que apontem defeitos nas rimas bem sei que não se deve rimar com tempos verbais mas foi o que se conseguiu hoje com o café da manhã (as rimas vinham no pacote de açúcar no caso de estarem com dúvidas). Por outro lado "lutar" não é para ser tomado sobre a forma da violência, mas antes do não conformismo, sempre pela paz, sempre pela paz que é a melhor (a única diria) forma de mudar.

domingo, 30 de janeiro de 2011

Milton Babbitt (1916 - 2011)

Como sabem os nossos leitores mais atentos um dos blogs que seguimos com mais atenção é o The Rest is Noise onde ficamos a saber que Milton Babbit faleceu ontem a 29 de Janeiro. Milton Babbit foi um compositor contemporâneo adepto do serialismo e autor de sofisticadas e complexas orquestrações. Babbitt foi professor da Juillard e membro da Academia America de Artes e Letras desde 1965.

As sua composições podem ser divididas em três grande períodos. Do ultimo período escolhemos Concerto Piccolino for Vibraphone. Philomel do segundo período (1964) é outro exemplo relevante (poema de John Hollander).

Quem me conhece sabe que esta não é definitivamente "a minha chávena de chá" mas há um artigo deste compositor editado na High Fidelity de 1958 que vale a pena lerem. Chama-se esse polémico artigo "O Compositor enquanto especialista" embora o editor tenha alterado o título (sem o consentimento ou sequer o conhecimento do autor) para "Que importa se alguém ouve". Mudança que tornou o titulo obviamente muito mais polémico e se não garantiu mais adeptos para a música de Babbitt pelo menos garantiu muito mais leitores para o referido artigo. Em resumo neste artigo defende que o compositor contemporâneo não se deve preocupar com quem ouvirá dado que se o fizer deixará de poder inovar livremente e estará limitado ao que pode ser facilmente apreendido, que resultará possivelmente no igual e por consequência na morte da inovação. É um tema que já abordamos aqui várias vezes e que por isso vai merecer a tradução integral e comentada deste provocador artigo.

Além do artigo de Alex Ross consultamos o Jornal da Juilliard e o dicionário Grove Music Online (sem link porque requere subscrição - sorry).

domingo, 23 de janeiro de 2011

Sinfonia em Branco Maior

Confesso que quando li o post Symphonie en Blanc Majeur pensei imediatamente no blog Branco no Branco uma das minhas leituras regulares e a fonte de uma educação visual que tanta falta faz. Utah em branco, Felgueiras assim geminadas pela mesma cor, branco no branco, uma Sinfonia em Branco Maior como diz Alex Ross.

sábado, 22 de janeiro de 2011

A melhor pesquisa de ontem (#5) - Sibelius vozes interiores

"Voces Intimae" ou Vozes interiores ou Intimas ou talvez melhor "Vozes Amigas" é efectivamente o subtítulo do quarteto de Sibelius Op. 56  composto em 1908 em Ré Menor.  Trata-se de uma obra de carácter bastante sombrio (embora existam contrastes dramáticos na obra) tendo sido escrito numa época de crise financeira e de saúde. Cronologicamente este quarteto foi escrito entre a Terceira e a Quarta sinfonia numa altura em que Sibelius julgava padecer de um cancro na garganta.

O nome da obra provém de uma nota escrita na partitura de um amigo. O quarteto inclui cinco andamentos:

I. Andante - Allegro molto moderato
II. Vivace
III. Adagio di molto
IV. Allegretto (ma pesante)
V. Allegro

Uma interpretação típica apresenta uma duração de cerca de meia-hora. Propomos que oiçam uma interpretação do KOCIANOVO KVARTETO  precisamente do primeiro andamento.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

FEMUSC - 6º Festival de Música de Santa Catarina

Pela primeira vez neste blog (e com grande alegria permitam-me que vos diga) vou conseguir dar uma sugestão para os nossos leitores brasileiros. Bem sei que o Brasil é grande como um continente e que assim sendo esta recomendação para alguns de vós é quase equivalente a eu recomendar a um português que vá assistir a um concerto em Paris!

Passando ao assunto deste post gostaria de vos falar um pouco do FEMUSC - 6º Festival de Música de Santa Catarina que por esta hora já se iniciou com o seu Concerto Inaugural de Gala. Mas não fiquem preocupados porque em Santa Catarina vão haver muitas ocasiões (mais de duzentas para ser preciso) para ouvir música até ao próximo dia 5 de Fevereiro.

Contando com uma orquestra de cerca de 60 elementos vindos de mais de 20 países este festival de música integra ainda um concurso de Harpa (segunda edição). O festival decorre na cidade de Jaguará do Sul.

Caros leitores do sul do Brasil não se esqueçam de ir ver e ouvir música porque como sempre vos digo: Ao vivo é outra coisa.

Poderão facilmente encontrar mais informações sobre o festival na internet (google: FEMUSC) ou então enviando email para: festival@femusc.com.br . 

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A melhor pesquisa de ontem (#4) - Estações Haydn Facsimile

Estamos a falar de uma das grande obras de Haydn um dos pilares do período clássico. Pensamos que este leitor pretendia encontrar a partitura original da obra. Não conseguimos encontrar esse documento mas graças ao Archive.Org podemos propor uma partitura completa que será possivelmente das primeiras edições.

domingo, 16 de janeiro de 2011

A melhor pesquisa de ontem (#3) - "O aristocrata do cello"

Estamos a falar do violoncelista francês Pierre Fournier (1906-1986) que assim era apelidado pela forma altiva e polida como tocava. Falamos aqui deste violoncelista.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A melhor pesquisa de ontem (#2) - "Eduardo Gabarra Winterreise"

Eduardo Gabarra foi o autor da tradução de base que utilizamos quando percorremos todo o ciclo de canções Winterreise de Schubert. Apesar de termos sempre em cada um dos posts mencionado a base da tradução, o local onde a poderiam encontrar e apontado a uma cor diferente as pequenas alterações que sugeríamos penso que é completamente merecida não só esta menção adicional como também é devido um grande obrigado ao Eduardo. Sem ele teria sido muito mais penoso efectuar a tradução do inglês ou do francês já que não creio que o meu parco alemão fosse suficiente.

Assim para resumir podem ler neste blog tudo sobre o Ciclo Winterreise de Schubert. As traduções originais do Eduardo Gabarra estão aqui.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A melhor pesquisa de ontem - "o que dar de presente para quem gosta de violino"

É uma boa questão. Depende da idade claro. Depende também se gosta de ouvir tocar ou se prefere ou pretende iniciar-se na arte de tocar o violino. Claro que um qualquer concerto mais relevante do reportório romântico interpretado por um violinista de referência será sempre um bom presente.

Para recomendar algo ligeiramente diferente e que seja mais ou menos universal para todos esses perfis vou propor um documentário que inclui uma série espantosa dos grandes interpretes do instrumento "The Art of Violin" um filme de Bruno Monsaingeon com interpretações de uma verdadeira constelação de estrelas: Enescu, Ferras, Francescatti, Grumiaux, Heifetz, Kogan, Kreisler, Menuhin, Milstein, Neveu, Oistrackh, Ysaÿe entre outros.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Novo documentário sobre João Carlos Martins

A Luciana Nunes deu-nos a conhecer a existência de um novo documentário sobre o maestro João Carlos Martins. Além do excelente filme podem participar num passatempo em que poderão ganhar um livro de José Carlos Monteiro – “História Visual: Cinema Brasileiro”.

Dada a minha profunda admiração pelo maestro João Carlos Martins não podia deixar de vos recomendar ouvirem e verem este magnifico documentário que ilustra perfeitamente a história de superação, a lição de vida que nos proporciona este maestro brasileiro.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Jean Sibelius (1865 - 1957)

Sibelius é um daqueles compositores que me provocam uma grande dose de tristeza por terem sido tão maltratados durante o seu período de vida. No caso de Sibelius porque insistia, graças a Deus :-), em escrever música neo-romântica quando a linguagem do século já era outra ...

Jean Sibelius nasceu em Hämeenlinna no Grão Ducado da Finlândia no dia 8 de Dezembro de 1865  no que era então uma dependência do Império Russo numa família de língua sueca. Porém apesar de toda esta mistura (ou se calhar por causa dela) foi o primeiro dos grandes expoentes (e de certa forma consolidadores) da identidade nacional finlandesa.

No seu livro "The Rest is Noise" Alex Ross dedica um dos seus capítulos intitulando-o Apparition from the Woods: The loneliness of Jean Sibelius. Neste capítulo além da análise das princiipais obras do compositor Finlandês Alex Ross explica-nos uma parte do drama de Sibelius citando um trabalho de Kundera em que ele fala das "Pequenas nações da europa" e do sentimento de isolamento que os heróis nacionais dessas pequenas nações podem sentir. todos sabem de tudo dos seus heróis, não há espaço para o erro. Isto pode ser uma pressão insuportável. Para Sibelius atormentado que estava pela recepção do seu trabalho nos meios intelectuais  europeus, recepção altamente negativa ao ponto de terem apelidado Sibelius "o pior compositor de sempre" pode ter sido um pouco demais ...

Claro que a solidão não provém apenas do facto anterior. ser considerado um elemento "fora de tempo", um compositor sem nada de novo a dizer foi certamente a outra parte do problema de Sibelius. Problema amenizado (ou talvez não, paradoxo resultante do facto anterior) da enorme popularidade de que gozava na Finlândia e nos Estados Unidos onde era considerado nem mais nem menos que o novo Beethoven. Na verdade terá sido necessário chegarmos ao fim do século XX para que alguns musicólogos tenham por fim entendido que estar "a la page" nem sempre é sinónimo de inovação e que por vezes trabalhar em modelos aparentemente do passado pode ser precisamente a expressão de uma voz interior que não liga a épocas ou modas. No que me diz respeito já sabem para onde vão as minhas simpatias. Um dia destes ainda me v~em com calças de sino de novo ...

Há dois tipos de composição onde Sibelius focou o seu talento: O poema sinfónico e a sinfonia. Existem para além destas formas duas outras obras de que estão de certa forma isoladas na obra do compositor mas de que teremos de falar pela sua enorme relevância no trabalho do compositor e sobretudo - pelo menos em um dos casos - na sua relevância no reportório actual. Estamos a falar claro da Valse Triste (Op. 44) composta em 1903 e o famoso concerto para violino e orquestra  Op. 47 (1903-1905).

No que diz respeito ao Poema Sinfónico foi neste tipo de composição que podemos dizer sem exagerar em demasia que uma boa parte da identidade finlandesa se fixou. Não só porque Sibelius soube capturar musicalmente a alma finlandesa (por exemplo indo buscar elementos ao folclore, técnica em que aliás precedeu tanto Bartok como Stranvinsky) como também soube encontrar a poética adequada de base tradicional finlandesa que o fixou definitivamente como um representante nacional ao ponto de hoje se perguntarem a um finlandês o que é próprio à Finlandia possivelmente para além da famosa marca de telemóveis a referência mais frequente será "o nosso Sibelius".  Dessas composições a primeira Kullervo (Op. 7) é baseada no poema épico Kalevala tendo sido o primeiro grande sucesso do compositor. Seguiram-se vários outros dos quais En Saga (Op. 9), Karelia Suite (Op. 10) e  Finlandia (Op. 26).

No que diz respeito às sinfonias Sibelius tal como Beethoven procurou em cada uma das sinfonias basear-se na anterior melhorando-a ou complementando-a na busca da perfeição. Essa procura foi uma das causas adicionais para que Sibelius tenha muito cedo terminado a sua produção enquanto compositor. É conhecido hoje o facto de Sibelius ter destruído a sua oitava sinfonia - aquela que deveria sumarizar tudo o anterior - depois de anos e anos de tentativas (e de ter por várias vezes prometido-a aos seus fãs americanos). Simplesmente Sibelius não se sentia capaz de tal tarefa quer pela tarefa em si quer pela pressão auto-induzida ou induzida pelo exterior. Facto é que essa oitava ficará para sempre apenas como memória do que poderia ter sido.

Das várias sinfonias a ultima (a sétima) composta em 1926 marca o fim do período de produtividade de Sibelius. Depois disso ainda compôs mais algumas obras de música para teatro (para a peça de Shakespeare - A Tempestade) e o poema sinfónico Tapiola mas na realidade nada que tenha o relevo da sua produção passada e sobretudo nada de comparável quanto à quantidade do período anterior.

Sibelius faleceu a 20 de Setembro 1957 no meio da natureza de que tanto gostava.

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