Na impossibilidade de ouvir o concerto de ontem Segunda-Feira e o recital de amanhã Quarta-Feira não podia perder a conferência na Fundação Gulbenkian de apresentação do seu livro "Tudo está ligado - O Poder da música".
Como já vos disse tenho uma admiração profunda por Daniel Barenboim por tudo aquilo que ele representa, pela coragem das suas ideias e por mesmo assim nunca aceitar compromissos na sua arte, a música mesmo quando (e sobretudo - mas já lá iremos) quando ela - a música - desempenha um papel de mediação ou de transcendência.
Esteve igual a si mesmo quando começou por falar do médio-oriente. Com coragem para explicar que na verdade só haviam duas alternativas e que ambas lhe pareciam impossíveis. Com coragem para dizer que um dos problemas do estado hebraico é não reconhecer que pelo menos terá uma quota parte da responsabilidade do problema palestiniano.
Falou depois do papel da música e disse-nos que esta era impossível de definir porque se o fosse então não valeria a pena interpreta-la. "A música não interessa por aquilo que é mas por aquilo que nós achamos que ela é, por aquilo que desperta dentro de nós, pela nossa interpretação dos sons". Não é assim que não tenha conteúdo mas antes que o seu conteúdo é essencialmente abstracto.
Falou-nos de Furtwangler e disse-nos que com ele a ligação tinha outro sentido pela sua capacidade única intuitiva de ligar várias partes de uma obra. Contou-nos como tinha conhecido Pierre Boulez e disse-nos que nunca tinha visto tamanha facilidade e tanto talento. Citou Celibidache dizendo que a mediocridade nem era um grande problema per se. Problema mesmo é ser contagiosa.
Explicou-nos que a música não pode "servir" para nada a não ser mudar-nos por dentro se aceitarmos o facto de que necessitamos de arte (e não apenas de música) para ser feliz. Fez o paralelo com Hitler e com Estaline e disse-nos que a música para poder ser um instrumento de mudança teria de ser de alguma forma introduzida na nossa vida "física".
Sem papas na língua explicou que o problema da democracia nos dias de hoje era o "marketing" que pouco podia resistir a essa máquina poderosa de superficialidade.
Para vos ser sincero ainda estou a "digerir" o que ouvi. Depois de ler o livro garanto-vos uma descrição mais detalhada. Se podia não ter ido a esta conferência? Se a vida não continuaria ? Podia. Continuava. Mas não seria a mesma coisa :-)
Este post merecia um tweet que já fiz. Parabéns pelo tema e há que agradecer a existência de pessoas como Barenboim
ResponderEliminarObrigada por nos contar, Fernando, deve ter valido bem a pena ir ouvir o maestro.
ResponderEliminarDepois conte-nos sobre o livro.
Barenboim é sem dúvida uma figura cimeira da cultura musical.
ResponderEliminarPessoa muito inteligente e sensível aos problemas deste Mundo.
Pessoa muito musical, talentoso e um óptimo pianista e maestro.
Pena é que o seu recital de 4ª feira tenha sido bastante sofrível.
Tudo muito "aldrabado". Pedal mal utilizado, articulação pouco clara. O melhor foram as ideias musicais, mas a forma como tentou pôr essas ideias em prática foi fraca. Que pena.
Para variar teve direito a uma ovação de pé e grande simpatia do público, muito por "culpa" da Polaca Op.53.
Dois números extra programa (entre eles uma bela interpretação de um Nocturno).
Geocrusoé: Obrigado pelas palavras.
ResponderEliminarGI: Valeu a pena ouvir o maestro sim. Será talvez exagero dizer que me mudou a vida ... ou talvez não. Logo direi.
Pianoman: Pois nem sempre as coisas correm bem. Também segundo parece ele estava doente e a sessão de autógrafos da véspera não deve ter ajudado muito.