Quando o pianista austríaco Paul Wittgenstein (1887-1961) perdeu um dos braços na primeira guerra seria difícil imaginar o impacto que este facto teria no reportório para piano. Paul Wittgenstein estava no entanto determinado a prosseguir a carreira de solista que havia começado apenas um ano antes do inicio do conflito.
Utilizando a fortuna da sua família encomendou uma série de concertos para serem interpretados por pianistas que dispusessem apenas da mão esquerda. Entre os concertos encomendados figurava o de Ravel. Wittgenstein não tinha propriamente um feitio fácil e muitos dos concertos recebidos foram rejeitados e nunca interpretados. Sempre pagos mas simplesmente colocados numa gaveta, o que era possível dado ser uma condição de Wittgenstein a exclusividade de interpretação dos mesmos enquanto em vida.
O próprio concerto de Ravel não escapou a alguma polémica entre o compositor e o interprete e a estreia a 5 de Janeiro de 1932 pela Sinfónica de Viena dirigida por Robert Heger continha algumas adaptações que Ravel não aprovava. Temos a sorte de poder ouvir no YouTube uma gravação histórica pelo próprio Wittgenstein de 1937 com a Orquestra do Concertgebouw dirigida por Bruno Walter.
Até essa data Ravel não tinha ainda escrito nenhuma obra de grande dimensão para piano embora tivesse intenção de o fazer, a encomenda de Wittgenstein foi o catalisador para que escrevesse em simultâneo o concerto de que hoje falamos e o muito mais conhecido Concerto em Sol Maior.
Este concerto foi concebido como uma peça num unico andamento que pode ser dividido em três partes que seguem a habitual configuração do concerto "lento-rápido-lento" porém sem a interrupção formal dos andamentos separados.
Inicialmente uma das características que não agradou particularmente a Wittgenstein foi a nítida influência do Jazz já presente em várias composições de Ravel na altura e que neste concerto não deixam de aparecer em vários momentos da peça - especialmente na contribuição da percussão e dos sopros.
O concerto começa com um pianissimo que é quase inaudível interpretado pela orquestra que é depois seguido de uma primeira longa cadenza interpretada pelo piano solo. De novo mais uma das razões de desacordo entre Wittgenstein e Ravel que terá dito a propósito dessa cadenza : "Se quisesse tocar sozinho não teria encomendado um concerto para piano e orquestra". Uma belissima cadenza que introduz o tema principal.
O que é importante notar neste concerto é que a preocupação do compositor em não transformar este concerto numa prova de capacidades técnicas do solista acaba por lhe conferir um tom bastante sombrio pela utilização de uma maior quantidade de sons graves, de certa forma a fronteira normal da mão esquerda do pianista.
Especialmente notável é também a cadenza final onde confluem e são "misturados" todos os temas da obra num memorável crescendo . Deixamos para terminar uma interpretação completa de Jean Efflam Bavouzet com a Orquestra Philharmonia dirigida por Esa-Peka Salonen nas Proms de 2010.
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